De acordo
com o Ipea, nesse período de aproximadamente 30 anos, as mulheres somam, em
média, 22,4 anos de contribuição para a Previdência Social. Um total de 44,4%
das mulheres às quais foram concedidas aposentadorias em 2014 atingiram até 20
anos de contribuição.
A
pesquisadora do Ipea Joana Mostafá explica que essas informações foram obtidas
por meio de uma parceria que possibilitou o acesso a microdados do extinto Ministério
da Previdência Social - atualmente Secretaria da Previdência Social, vinculada
ao Ministério da Fazenda.
Segundo
Joana, as interrupções na contribuição previdenciária feminina são causados por
situações como desemprego, trabalho informal, afastamento do mercado de
trabalho para cuidar dos filhos, entre outras. Com base nesse cenário, o Ipea
lançou uma nota técnica na última semana na qual defende que as idades de
aposentadoria de homens e mulheres devem ser diferentes.
"A
princípio, a diferença [no sistema em vigor hoje, em que a mulher se aposenta
cinco anos mais cedo que o homem] é justificada", disse a pesquisadora.
Atualmente, para se aposentar, o homem deve acumular 35 anos de contribuição e
a mulher, 30. Há ainda a opção da aposentadoria por idade, que exige 15 anos de
contribuição e idade de 65 anos para o homem e 60 anos para a mulher.
A Proposta
de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, de reforma da Previdência, atualmente
em discussão na Câmara dos Deputados, altera esse modelo e estabelece como
condição para a aposentadoria no mínimo 65 anos de idade e 25 anos de
contribuição para homens e mulheres. Um dos argumentos do governo para a
mudança é que as mulheres vivem mais que os homens.
Acordo
social
Segundo
dados do IBGE, ao atingir os 65 anos, a mulher tem uma sobrevida 3,1 anos
superior à do homem. Mas, para Joana Mostafá, usar a sobrevida como base para
equiparação das aposentadorias está em desacordo com a função da Previdência.
"O acordo da Previdência é um acordo social. Ele visa, entre outras
coisas, compensar algumas desigualdades do mercado de trabalho", afirma.
A
pesquisadora destaca que outros fatos, além da jornada dupla de trabalho,
distanciam a realidade feminina da masculina. "Estamos falando da
desigualdade ocupacional, da diferença de salários e da taxa de desemprego, que
é maior entre as mulheres do que entre os homens. A mulher poderia contribuir
mais [para a Previdência] se não fossem essas dificuldades", afirma.
A
pesquisadora Luana Mhyrra, professora do Departamento de Demografia e Ciências
Atuariais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), corrobora
dizendo que os sistemas nos quais os participantes ganham de acordo com o que
poupam e com o tempo que contribuem são modelos de capitalização, diferentes da
proposta previdenciária brasileira.
"Os
fundos de Previdência complementar [privados] são exemplos de fundos
capitalizados, que atualizam e capitalizam o dinheiro aplicado pelo
contribuinte. Isso não se aplica ao RGPS [Regime Geral da Previdência Social]
do Brasil, uma vez que quem contribui hoje não o faz para sua própria
aposentadoria e sim para aqueles que já estão aposentados. Pensar que a mulher
precisa contribuir mais porque vive mais é coerente quando se pensa em um fundo
capitalizado", ressalta.
Queda na
desigualdade
De acordo
com o governo, ao equiparar-se a idade de aposentadoria masculina e feminina, a
desigualdade no mercado de trabalho tende a cair. Recentemente o ministro da
Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que a defasagem entre os salários de
homens e mulheres acabará em até 20 anos.
A
pesquisadora Joana Mostafá admite que tem havido uma redução na desigualdade de
renda. Segundo ela, dados da Pnad apontam que em 1995 o rendimento da mulher
equivalia a 55% do rendimento dos homens. Passados 20 anos, em 2015, esse
percentual havia subido para 76%. Joana alega, entretanto, que a melhora não é
verificada em outros indicadores. Ela cita como exemplo a participação da
mulher no mercado de trabalho. "Desde 2005, está em 60%. Não se
move", afirma.
Em debate na
Câmara dos Deputados, a assessora especial da Casa Civil da Presidência da
República Martha Seillerdisse que as justificativas para manutenção da
diferença de idade mínima para aposentadoria entre homens e mulheres já não se
sustentam como antigamente.
Martha
lembrou que a pirâmide demográfica brasileira está cada vez mais desfavorável à
manutenção de um sistema previdenciário equilibrado, já que a base jovem tem
diminuído, devido à queda na taxa de natalidade, ao crescente número de idosos
no topo, com o avanço da expectativa de vida. "Como é que esse sistema
previdenciário sobrevive com uma mudança tão brusca na taxa de natalidade e
expectativa de vida sem passar por mudanças?", questionou.
A assessora
da Casa Civil disse que as regras de transição previstas na reforma para
vigorar em 20 anos podem compensar as desigualdades ainda existentes. Ela
acrescentou que a diferença de cinco anos é a maior entre os regimes de outros
países que ainda consideram a necessidade de diferenciação. *Terra Foto: Arquivo Agência Brasil |