O aparelhamento do Itamaraty pelo PSDB,
dentro da política de distribuição de prebendas e sinecuras de Michel
Temer, é a pior coisa que aconteceu para a política externa brasileira
desde a Independência, e até desde antes, os tempos de Alexandre de
Gusmão e o Tratado de Madri, de 1750 (embora este tivesse consequências
funestas para as Missões Jesuíticas do Rio Grande do Sul).
José Serra promoveu o enterro da política tradicional brasileira, de
sublinhar a negociação em detrimento da agressão, coisa definida
profissionalmente pelo estilo consagrado de Rio Branco. O Brasil teve
políticas diplomáticas mais agressivas, mas em tempos caracterizados por
campanhas de ocupação, consequências de guerras declaradas ou não, como
foi o caso dos conflitos em torno do Rio da Prata e depois da chamada
Guerra do Paraguai. Teve ainda outros pontos de conflito, como no caso
do Acre, mas que terminaram na mesa de negociação. Ainda durante a
ascensão do nazi-fascismo na Europa diplomatas brasileiros se
comportaram de maneira vergonhosa, favorecendo a perseguição dos judeus.
Mas outros se comportaram de modo mais digno, facilitando sua fuga.
Nem mesmo durante a ditadura militar o Brasil foi tão belicoso do
ponto de vista diplomático – embora apoiasse golpes e ditaduras em seu
entorno, e o governo brasileiro fizesse uma campanha sibilina para que
d. Helder Câmara não ganhasse o Nobel da Paz, que acabou sendo atribuído
a Willy Brandt (não que este não o merecesse) em 1971.
José Serra introduziu um estilo cheio de gafes, como o de fazer piada de mau gosto sobre o alto número de mulheres na política mexicana, prever a vitória de Hillary Clinton, agredir os vizinhos cujos governos fossem de esquerda,
além de reduzir o Brasil a um zero à esquerda na diplomacia mundial. O
Itamaraty sob intervenção periga tornar-se um apêndice do Departamento
de Estado norte-americano.
Agora este estilo é reconsagrado por Aloysio Nunes,
o ex-companheiro Mateus dos tempos da ALN, que já partiu para a
agressão ao governo venezuelano, com mais ares de pitbull do que de
rinoceronte.
Está certo que o campo da diplomacia internacional está longe de ser
uma loja de porcelanas. Nem por isso é um quartel de divisões de
artilharia.
Porém seria injusto atribuir esta inoperância diplomática apenas às
personalidades de ambos os chanceleres. Não. Ela se deve também ao mundo
mental que impera no PSDB, anacrônico, herdeiro contumaz dos efeitos da
Guerra Fria no nosso continente, crente fanático na dependência dos
centros hegemônicos da política ocidental, como se estes centros ainda
fossem hoje os governos de Washington, Londres, Paris, e não os moguls
financeiros assentados em Wall Street, na City londrina – a bolsa de
Paris está fora de moda, e o poder na Europa se divide, em Frankfurt,
entre o Banco Central Europeu e o Alemão.
Paradoxalmente, correm ecos de que a intervenção do PSDB no Itamaraty
provocou um certo alívio entre os diplomatas de carreira, mesmo
aqueles que seriam simpáticos a esta guinada para o anacronismo. O
motivo desta sensação seria a percepção de que para o Itamaraty
profissional seria mais danoso ter que assumir diretamente a
responsabilidade pela política externa de um governo tão pífio quanto o
de Temer, que está reduzindo o prestígio internacional do Brasil a uma
cifra mais negativa do que o seu PIB. *Bloque do Velho Mundo |